DIREITOS
FEDERATIVO E DIREITOS ECONÔMICOS:
A
REALIDADE “PÓS” EXTINÇÃO DO PASSE
A Lei 9.615/1998, conhecida
como Lei Pelé é a Lei Orgânica do Desporto Brasileiro e em seu art. 28, § 2º
extinguiu o “passe” dos atletas ao dispor que o vínculo do jogador com o clube
é acessório ao contrato de trabalho e com ele se extingue.
Ao contrário do que ocorria
anteriormente quando o vinculo que prendia o atleta ao clube, não se dissolvia
com o término do contrato de trabalho, com o advento da Lei Pelé, findando-se o
pacto laboral, o atleta está livre para firmar novo contrato de trabalho com
outro clube.
Após muita polêmica e
preocupação por parte dos clubes que tinham em seus atletas seu maior
patrimônio, o esporte, especialmente o futebol, adequou-se à nova realidade.
Para proteger “seu
patrimônio” os clubes passaram a realizar contratos de maior duração e, em caso
de rescisão (transferência) fizeram “jus” a cláusula penal no valor de até cem
vezes o salário anual do jogador para transferências nacionais e ilimitado para
as internacionais, conforme assevera o art. 28, caput, da Lei 9.615/1998.
Assim, ao invés de vender o
atleta, o clube (empregador) passou a receber verba rescisória pelo término do
contrato antes do prazo por iniciativa do empregado (jogador).
Neste esteio, houve uma
espécie de divisão do direito sobre a atividade do atleta entre direitos
federativos e direitos econômicos.
O Direito Federativo
constitui o direito do clube em registrar o atleta na Federação (CBF) estabelecendo
um vínculo com a agremiação onde o empregado exercerá seu trabalho. O Direito
Federativo é oriundo do contrato de trabalho entre o clube e o atleta, sendo acessório
ao pacto laboral. Assim, uma vez terminado ou rescindido o contrato de
trabalho, extingue-se também o direito federativo.
Desta feita, os direitos
federativos são indivisíveis, eis que não podem ser parcialmente cedidos nem
divididos. Os direitos federativos serão sempre integralmente (100%) do clube
pelo qual o jogador atuará, ou seja, no qual o atleta está registrado, ainda
que por empréstimo. Por exemplo, se o Atlético empresta o jogador Diego Tardelli
ao Internacional, durante o período do empréstimo 100% dos direitos federativos
serão de titularidade da equipe gaúcha.
Ressalte-se que o jogador
emprestado deve anuir com o empréstimo/cessão de seu contrato, bem como deve
haver registro na Federação (CBF), razão pela qual o clube que recebeu o jogador
em empréstimo é responsável pelo seu contrato de trabalho durante o tempo que o
atleta estiver atuando por ele. Dessa forma, em caso de empréstimo, todos os
direitos e obrigações são da equipe em que ele estiver jogando e não da equipe
que o emprestou. Terminado o período de empréstimo, o atleta retorna ao clube
para cumprimento do restante de seu pacto laboral.
Por outro lado, os “direitos
econômicos” representam a receita gerada com a rescisão unilateral do contrato
de trabalho por parte do atleta, via de regra, motivados pela transferência a
outro clube. Trata-se de espécie de cessão onerosa (temporária ou definitiva)
do direito federativo estabelecido em contrato de trabalho.
Constantemente os direitos
econômicos são negociados com terceiros estranhos às atividades esportivas,
conhecidos como investidores, que adquirem determinado percentual dos direitos
econômicos sobre um atleta, pagando ao clube que detém o direito federativo (e
o direito econômico) o preço ajustado para a negociação.
Ao contrário dos direitos
federativos, os direitos econômicos podem ser parcialmente negociados pelos
clubes com terceiros. Assim, o Atlético poderia ceder a investidor 20% dos
direitos econômicos sobre o jogador Diego Tardelli e, em caso de transferência
(rescisão do contrato de trabalho), o empresário teria direito a receber o
referido percentual do valor da cláusula penal.
Sobre a diferença entre os
"direitos federativos" e os "direitos econômicos", LUIZ
FELIPE SANTORO, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo, em
artigo intitulado "Diferenças entre os direitos federativos e econômicos
no futebol", elucida:
"Direito Federativo é o
direito do clube em registrar o atleta na Federação (CBF) como vinculado a ele
(clube). O Direito Federativo nasce com a celebração do contrato de trabalho
entre o clube e o atleta e é acessório ao contrato de trabalho. Assim, uma vez
terminado ou rescindido o contrato, extingue-se o direito federativo.”
Na prática, ao contratar um
jogador e registrá-lo junto à CBF (adquirindo, portanto, os "direitos
federativos"), o clube estipula cláusula penal obrigatória no contrato, em
função do disposto no caput do art. 28 da Lei 9.615/98, que incidirá em casos
de rescisão unilateral, rompimento ou descumprimento da avença pelo jogador.
Como o valor da
"multa" pode atingir quantias elevadas e, em se tratando de grandes
atletas, pode ocorrer assédio por outras agremiações antes do final de seu
contrato, então o clube que detém os seus "direitos federativos"
passa a negociar a rescisão antecipada que se consubstancia na venda (ou
cessão) dos "direitos econômicos", que nada mais são do que
percentuais previamente fixados sobre o eventual recebimento da cláusula penal
a que se refere o aludido art. 28.
O negócio jurídico, envolvendo
os "direitos econômicos", constitui investimento de
"risco". Destarte, um jogador é contratado pelo clube "X" e
em seu contrato de trabalho, é estipulada uma cláusula penal de R$30.000.000,00
(trinta milhões de reais). Tendo em vista que o atleta está despontando, o
clube cede ou vende 40% dos "direitos econômicos" do jogador a
empresa "Y" (que pode ser qualquer empresa, ou mesmo pessoa natural).
Pela aquisição da referida percentagem, a empresa "Y" paga à
agremiação a quantia de R$1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais). Com
a transferência do jogador para qualquer outro clube, antes do término de seu
contrato de trabalho, esta receberá, nada menos do que R$12.000.000,00 (doze
milhões de reais), da cláusula penal total (R$30.000.000,00), paga ao clube
"X". Por outro lado, inocorrendo a transferência do atleta e seu
contrato de trabalho viesse ser extinto pelo decurso do prazo, a empresa
"Y" quedaria em prejuízo.
Tal prática tem se tornado
corriqueira no desporto brasileiro, inclusive, o Banco mineiro BMG, cujo
Presidente Ricardo Guimarães foi dirigente máximo do Clube Atlético Mineiro,
criou fundo de investimento em atletas, registrado na CVM (Comissão de Valores
Mobiliários) com patrimônio de cinqüenta milhões de reais, de nome SOCCER BR1
cujas as operações correspondem à compra e venda de direitos.
A título de ilustração do
quão pode ser rentável o investimento em direitos federativos, o jogador
santista Paulo Henrique “Ganso” teve 45% dos seus direitos econômicos
adquiridos por um empresário, por € 2,2 milhões, quando ainda era
desconhecido. Já houve proposta de € 20 milhões para transferir o atleta
para uma equipe francesa. Seu companheiro de equipe, o atacante Neymar, teve
40% dos direitos adquiridos por investidor que poderá ter rentabilidade
semelhante, pois o percentual custou ao empresário € 3 milhões e,
atualmente, o jogador pode ser negociado por cerca de R$ 35 milhões, dos quais
€ 14 milhões seriam embolsados pelo investidor.
Percebe-se, portanto, que,
com o fim do instituto do “passe” surgiu a figura do “investidor” e os clubes
viram-se obrigados a gerenciar os contratos dos atletas e a dicotomia entre
direitos federativos e direitos econômicos eis que o término do contrato de
trabalho do atleta por decurso de prazo passou a traduzir prejuízo à agremiação
e aos eventuais investidores.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMBIEL, Carlos Eduardo e SANTOS JUNIOR, Walter Godoy
dos. Relação entre contrato de trabalho e contrato de licença de uso de imagem
(disponível em www.desporto.com.br/layout/Licen%E7a.htm
Monteiro de Barros, Alice, O
ATLETA PROFISSIONAL DO FUTEBOL EM FACE DA "LEI PELÉ" (n. 9.615, de
24.03.98), Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg. - Belo Horizonte, 30 (60): 153-170,
Jul./Dez.99
GRISARD,
Luiz Antonio. Considerações
sobre a relação entre o contrato de trabalho de atleta profissional de futebol
e contrato de licença de uso de imagem. (disponível em http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3490,
acessado em 06/11/2008.
HOJE EM DIA, http://www.hojeemdia.com.br/cmlink/hoje-em-dia/noticias/economia-e-negocios/atleta-pode-ser-boa-opc-o-de-investimento-1.149670
, acessado em 09 de fevereiro de 2011.
TERCEIROTEMPO,http://terceirotempo.ig.com.br/noticia/BMG_se_torna_investidor_mais_influente_nos_clubes_brasileiros-37614
, acessado em 09 de fevereiro de 2011.
Quando o colega se refere à "cláusula penal", seria a "cláusula indenizatória desportiva", de acordo com as alterações da Lei Pelé promovidas pela Lei 12.395/2011?
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